O Núcleo da Guitarra e do Fado de Coimbra da Câmara Municipal de Coimbra (situado na Torre de Anto) recebeu, esta quarta- feira, António Vicente (Guitarra de Coimbra – anos 80) para uma conversa, na qual deu testemunho do seu tempo de inclusão estudantil na Canção de Coimbra, do seu contributo, assim como da sua análise aos tempos atuais. António Vicente defende que ”não existe fado de Coimbra, existe canção de Coimbra”. A designação de canção de Coimbra, como disse, abrangia os vários estilos que iam aparecendo. “Era um chapéu para tudo isto”, rematou.
A conversa com António Vicente integrou o novo ciclo de palestras da CMC, denominado “Canção de Coimbra: Memórias e Testemunhos”. Trata-se do segundo ciclo dedicado a esta temática, depois do sucesso obtido com o primeiro, intitulado “Canção de Coimbra: Cultores e Repertórios”.
Ao mesmo tempo que ia falando do seu percurso enquanto guitarrista e enquanto compositor, António Vicente abordou alguns aspetos relacionados com a canção de Coimbra, tocando em alguns pontos mais polémicos. Quando se falou do papel da mulher na canção de Coimbra, comentou que “o papel das mulheres na canção de coimbra é estarem sentadas a ouvir”. António Vicente é da opinião de que o “fado é um produto e tem de ser vendido como é”, lamentando o facto de hoje em dia ninguém comprar fado de Coimbra.
António Vicente recordou que, no seu tempo, as coisas eram mais difíceis, dizendo que “ninguém ensinava nada a ninguém”. “O dinheiro não importava, o que importava era tocar bem”, confessou. O guitarrista diria mesmo que chegou a tocar muitas vezes com instrumentos emprestados.
Referindo-se à nova geração que está a aparecer em Coimbra, António Vicente reconhece que existem bons instrumentistas e bons cantores. “Gente com vontade de aprender.” O único problema, segundo referiu, prende-se com o facto de tocarem coisas muito antigas e quase sempre o mesmo. Faltam, portanto, novos compositores e novos letristas com qualidade. No caso dos letristas, advertiu que tem de haver um certo cuidado com as palavras e, por exemplo, “não rimar chuva com uva”. “Eu por vezes gastava um caderno inteiro para escrever apenas uma letra”, contou o músico.
António Vicente citou alguns nomes que o influenciaram, como Manuel Branquinho, António Portugal e Rui Lucas. Não esqueceu de se referir à secção de fado, onde aprendeu a tocar guitarra com Francisco Dias, e referiu o importante papel que teve Joaquim Reis enquanto presidente daquela secção, ao levar Jorge Gomes e Fernando Monteiro para ensinarem guitarra.
Em jeito de desabafo, António Vicente diria: ”Fiz a banda sonora desta cidade e fui muitas vezes preso.”
Natural de Coimbra (1964), António Vicente licenciou-se em Direito na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (1990) e, mais tarde, pós-graduou-se no Instituto da Banca, Bolsa e Seguros exercendo, atualmente, funções nbanca.
Aprendeu viola com o mestre Arnaldo Silva, tendo integrado a sua orquestra “Melodias de Sempre”. Integrou a Secção de Fado da Associação Académica de Coimbra, onde estudou guitarra portuguesa com Francisco Dias, Fernando Monteiro e Jorge Gomes e aí fundou, com Rui Pedro Lucas e João Carlos Oliveira, o Grupo de Fados de Coimbra “Toada Coimbrã”.
No seio da Secção de Fado da ACC foi membro fundador da Estudantina Universitária de Coimbra (viola e voz), tendo composto temas musicais que se transformaram em ícones académicos. A título de exemplo: “Afonso”, “Traçadinho”, “Assim mesmo é que é”, “Amor a Coimbra”, “Dedicação”, “Balada de Maio”, “Canto da Noite “ ou “Portugal Total”. É autor da “Balada de Despedida do 5.º Ano Jurídico de 1986” e das letras das Baladas do 5.º Ano Jurídico de 88/89 e 89/90, bem como de diversos temas originais do Grupo de Fados “Toada Coimbrã”.
Com ambas as formações musicais fez digressões de relevo em Portugal e no estrangeiro.
Tem participação (viola/voz) num vasto conjunto discográfico. A saber: “Estudantina Passa”, “Canto da Noite”, “Portugal Total” (Estudantina Universitária de Coimbra), “Indo eu” (Infantuna Cidade de Viseu), no single (vinil) “Balada 5º ano J. 88/89 – Alta Noite na Sé Velha”, de resto, o último single em vinil editado que é dedicado à Canção de Coimbra. Com o “Toada Coimbrã” participou nos seguintes trabalhos discográficos: “Tradicionais”, “Baladas de despedida dos Anos 80”, “Baladas de despedida dos anos 90” e “Toada Coimbrã” (originais da Canção de Coimbra).
Foi coordenador e produtor do projeto/CD “Um Amor de 20 anos”, para a Cooperativa de Educação e Reabilitação de Cidadãos com Incapacidades de Águeda (CERCIAG), tendo sido o autor do hino da instituição.
António Vicente encontra-se em fase de ultimação do seu primeiro livro “…de passagem pela vida” e a preparar um projeto de Canção de Coimbra intitulado “Ecos da rua antiga”.
O novo ciclo de palestras “Canção de Coimbra: Memórias e Testemunhos” decorrerá até novembro próximo, à exceção de agosto, sempre na última quarta-feira do mês, às 18h30.
Os critérios subjacentes à escolha dos oradores envolvidos no renovado ciclo tiveram como prévias considerações o facto de, para além de não haver repetição dos oradores da edição anterior, ter-se optado por cultores que começaram por envolver-se na Canção de Coimbra há 40, 30 e 20 anos, ou seja, de finais da década de 70 até hoje.
Trata-se de um intervalo de tempo razoável para que a distância não turve a objetividade e a cronologia dos factos, aproximando-nos dos tempos atuais, pois alguns dos cultores da presente edição estão envolvidos no circuito atual de promoção da Canção de Coimbra para turistas, o que poderá trazer mais público ao ciclo de conversas organizado pela CMC.
Depois de 31 de maio, a calendarização do ciclo de palestras “Canção de Coimbra: Memórias e Testemunhos” para 2017 é a seguinte: 28 de junho – João Moura (Guitarra de Coimbra – anos 70/80); 26 de julho – Fernando Monteiro (Guitarra de Coimbra – anos 70/80); 27 de setembro – Ricardo Dias (Guitarra de Coimbra – anos 90); 25 de outubro – José Rabaça (Guitarra de Coimbra – anos 80); 29 de novembro – Luís Alvéolos (Cantor – anos 90).